O mundo do direito está passando por uma revolução silenciosa, impulsionada pela sua interseção com a tecnologia e o design. O resultado dessa fusão é conhecido como Legal Design, abordagem inovadora que busca tornar o universo jurídico mais acessível, compreensível e eficaz para todos.
Esse conceito abrange um outro que tem ajudado profissionais a ganharem casos e tempo nos processos: o Visual Law.
Neste artigo, exploraremos o Legal Design e o Law Design, por que eles são importantes, como estão transformando o direito e como podem ser usados por profissionais e órgãos para oferecer melhores resultados a todos.
O que é Legal Design?
No universo do direito, o Legal Design é uma realidade recente que traz consigo técnicas simples, mas capazes de tornar a indústria jurídica mais eficiente, transparente e acessível.
O Legal Design, conceito criado por Margaret Hagan, auxilia na criação de soluções centradas no ser humano, superando o complexo jargão e tornando os processos mais simples.
Essa técnica combina princípios de design, design thinking e tecnologia com o campo jurídico. Seu objetivo é melhorar a forma como as informações legais de qualquer tipo são apresentadas e compreendidas.
O Legal Design não se limita apenas à apresentação visual, mas também se concentra na experiência do usuário ao interagir com o sistema jurídico.
Isso inclui a simplificação da linguagem, o desenvolvimento de interfaces amigáveis para aplicativos e sites, e a criação de gráficos, infográficos e ilustrações para apresentar informações forma clara e concisa.
Qual a diferença entre Legal Design e Visual Law?
Legal Design e Visual Law são termos relacionados, mas com focos e ênfases ligeiramente diferentes. Ou seja, Visual Law é uma ferramenta dentro do campo mais amplo do Legal Design, mas, como ambos são aplicados para tornar o sistema legal mais centrado no usuário, muitas vezes são tidos como sendo o mesmo.
Dentro do contexto do Legal Design, o Visual Law é um importante elemento que se concentra em criar representações visuais de conceitos, produtos, argumentos e provas, além de processos judiciais e documentos jurídicos.
Essas representações visuais incluem gráficos, infográficos, diagramas e outros recursos visuais que simplificam a complexidade do vocabulário jurídico e economizam tempo.
Usando esses recursos, o Visual Law promove a transparência e melhora a comunicação entre advogados, clientes e o público em geral. Assim, ao informar por meio de elementos visuais, o Visual Law torna a comunicação eficaz e rápida. Veja, por exemplo, este modelo de infográfico destacando os benefícios de usar um organograma.
Já Legal Design é uma abordagem ampla que se concentra na aplicação do design e do UX à prática jurídica. Isso envolve a criação de soluções centradas no ser humano e não se limita à representação visual, mas abrange todas as facetas da experiência jurídica.
O conceito também inclui a consideração de elementos como empatia, pesquisa do usuário e colaboração interdisciplinar, criação de aplicativos e plataformas online para aprimorar a experiência de todos os envolvidos.
Neste contexto, exploraremos como o ambos desempenham papéis cruciais na transformação do direito por meio da aplicação do design centrado no usuário.
Por que o Legal Design é importante?
A principal razão pela qual o Legal Design é importante é a acessibilidade. Esse conceito torna o direito mais focado no ser humano ao tornar serviços jurídicos compreensíveis e atraentes. Outros aspectos importantes são:
Eficiência: Documentos legais pouco claros ou mal elaborados podem levar a mal-entendidos, atrasos e disputas legais prolongadas. Ao aplicar princípios de design, é possível criar documentos mais claros e concisos, reduzindo assim a possibilidade de erros e litígios desnecessários.
Inovação: À medida que os profissionais começam a incorporar princípios de design em seu trabalho, novas ferramentas e tecnologias são desenvolvidas para melhorar a experiência do usuário. Isso inclui chatbots, aplicativos, plataformas online e outros produtos que tornam mais fácil para as pessoas resolverem seus problemas legais.
Transparência: Quando documentos jurídicos, como contratos, são apresentados de forma clara e transparente, as pessoas entendem melhor e mais rápido o que está acontecendo. Isso fortalece a confiança no sistema jurídico como um todo.
Empoderamento: Quando as informações são apresentadas de maneira clara, as pessoas se sentem mais confiantes para tomar medidas legais ou buscar assistência jurídica quando necessário.
Princípios do Legal Design
O Legal Design é fundamentado em uma série de princípios que orientam a criação de produtos e soluções jurídicas visualmente atraentes e de fácil compreensão.
Alguns desses princípios incluem:
Clareza: A clareza é essencial no design e, portanto, no Legal Design e no Visual Law. Isso envolve o uso de infográficos, gráficos, ícones e ilustrações para apresentar informações.
Empatia: Os designers devem adotar uma abordagem empática ao criar soluções legais. Isso significa considerar as necessidades e preocupações das pessoas que usarão essas soluções.
Feedback: O Legal Design envolve um processo recorrente de coleta de feedback. Isso garante que as soluções legais atendam às necessidades do usuário e sejam continuamente aprimoradas.
Teste com Usuários: É importante testar soluções legais com usuários reais para garantir que sejam eficazes e compreensíveis. Os comentários podem ajudar a identificar áreas de melhoria.
Consistência: Manter a consistência na apresentação ajuda os usuários a entender e navegar melhor pelo sistema jurídico.
Design atraente: Um aspecto fundamental do é a criação de elementos visuais atraentes. Isso envolve o uso de cores, fontes, hierarquia, ilustrações e layout que tornam as informações mais agradáveis de ler e fáceis de compreender.
Aplicações Práticas do Legal Design
O Legal Design pode ser aplicado em uma ampla variedade de contextos. Aqui estão algumas das principais áreas onde o Legal Design está fazendo a diferença:
Documentos Legais
Uma das aplicações mais conhecidas é a criação de documentos jurídicos como contratos testamentos, acordos de divórcio, entre outros, que muitas vezes são repletos de linguagem complexa. Ao usar o Legal Design, esses documentos podem ser simplificados para as partes envolvidas.
Sites e Aplicativos Jurídicos
Muitas pessoas recorrem à Internet em busca de serviços jurídicos e assistência, e sites e aplicativos podem se beneficiar enormemente do Legal Design. Isso envolve a criação de interfaces, a organização lógica de informações jurídicas e a apresentação clara de recursos legais.
Educação Jurídica
O Legal Design é também uma ferramenta valiosa na educação jurídica. Departamentos jurídicos, professores e instrutores podem aplicar princípios de design para tornar os materiais de ensino mais envolventes e acessíveis aos alunos. Isso inclui o uso de gráficos, diagramas, mapas mentais, infográficos informativos, como este modelo com um passo a passo para criar um job aid.
Veja como exemplo este infográfico criado pela juíza Liliana de Oliveira Monteiro para servir como um guia rápido, com elementos como fluxograma, ilustrações e checklists para apresentar os passos necessários para participar de uma audiência virtual.
Resolução de Conflitos Online
A resolução de conflitos online é uma área em crescimento que se beneficia do Legal Design. Plataformas de resolução de disputas online podem aplicar o design para simplificar e agilizar o processo.
Acesso à Justiça
Uma das áreas mais cruciais onde o Legal Design está fazendo a diferença é no acesso à justiça. Muitas pessoas enfrentam barreiras significativas quando precisam lidar com problemas legais, seja na busca de indenização por acidentes de trânsito, análise de contratos, na resolução de disputas familiares ou na obtenção de assistência jurídica.
Aqui estão algumas maneiras pelas quais o Legal Design está tornando o acesso à informação e à justiça mais fácil e eficaz:
Documentação para Autoatendimento
Muitas pessoas não podem pagar um advogado para resolver seus problemas legais. Nesses casos, os formulários para autoatendimento desempenham um papel crucial. Com o Legal Design, esses formulários podem ser simplificados e organizados de forma lógica, permitindo que as pessoas preencham um documento de maneira mais eficaz.
Recursos Online
Plataformas online, como sites governamentais e portais jurídicos, podem se beneficiar muito do Legal Design, para ajudar as pessoas a entenderem seus direitos e opções legais.
Chatbots Jurídicos
A inteligência artificial e os chatbots estão se tornando mais comuns para fornecer orientações. O Legal Design é essencial para garantir que essas ferramentas sejam amigáveis e úteis.
Mediação e Arbitragem Online
A resolução alternativa de disputas, como a mediação online, está se tornando mais popular. O Legal Design desempenha um papel fundamental na criação de interfaces que ajudam as partes envolvidas a entender o processo e a tomar decisões informadas.
Assistência Jurídica Online
Plataformas de assistência jurídica online, que conectam advogados a clientes em potencial, também podem usar o Legal Design para tornar o processo mais transparente.
Boas práticas de Legal Design em 4 passos:
Etapa 1: Descoberta e Compreensão
Esta etapa envolve compreender a situação atual das partes interessadas e identificar profundamente o problema (sistemas, usuários e fluxos de trabalho). Para abordar esta etapa, existem várias ferramentas que podem ser usadas:
- Entrevistas: Faça perguntas para entender profundamente seus problemas e emoções. Isso ajudará a criar uma solução focada no usuário e na raiz do problema.
- Storytelling: Usar esta técnica é uma maneira fácil de entender de onde vêm os problemas de quem vai se beneficiar da solução. Peça-lhes para narrar um incidente descrevendo sua experiência com o problema. Essa informação ajudará você a observar os muitos desafios mentais, físicos e emocionais que sua solução precisa enfrentar.
- Colocar-se no lugar do outro: Experimente seu produto você mesmo, fingindo ser uma parte interessada.
- Mapas Pessoais: Crie mapas mentais, fluxogramas, diagramas de Venn, ilustrações, desenhos para sua própria compreensão.
Etapa 2: Síntese
Uma vez que uma boa quantidade de informações foi coletada na etapa de descoberta, esta etapa a estratégia é mapear o conteúdo em documentos estruturados.
Ferramentas de síntese:
- Mapa Mental: Ajuda a acompanhar os dados de maneira sequencial e a gerar ideias e soluções, uma vez que todas as informações estão visualizadas em um só lugar.
- Perfil de Persona: Identifica quem será o usuário de sua solução. Quais são suas necessidades, valores? O que eles desejam e esperam?
- Mapa de Jornada: Registra como os usuários reagem e se adaptam à sua solução, comparativamente ao estado atual deles.
- Pirâmide de Necessidades: A pirâmide de necessidades mapeia uma hierarquia das necessidades das partes interessadas identificadas, para adaptar a solução de maneira que a necessidade mais procurada seja atendida com prioridade.
- Fluxograma de Valor: Esta é uma ferramenta simples que ajuda o designer a reunir tudo o que os usuários precisam, para ter uma melhor compreensão do papel e utilidade de sua solução.
Etapa 3: Brainstorm e Construção
Esta é a etapa em que você constrói sua solução e faz brainstorming com equipes interdisciplinares, se contar com outras equipes, para definir uma estratégia. Para criar um bom design, é importante contar com ferramentas nesta etapa para visualizar as ideias e conceitos que deseja comunicar.
A principal ferramenta a ser usada nesta etapa é o mapa mental. Criar mapas mentais é uma maneira simples de visualizar e organizar suas ideia em um único diagrama. Esse é um recurso é altamente personalizável e pode incluir coisas como: Quem são os usuários? Como eles vão interagir com o recurso que você está criando? O que a solução está tentando alcançar? Qual é o seu objetivo?
Etapa 4: Testar, Iterar e Escalar
A Etapa 3 e a Etapa 4 idealmente devem ser executadas juntas. Depois de construir um protótipo, você deve testá-lo imediatamente, obter feedback e melhorar a sua solução.
Visual Law como ferramenta para profissionais do direito
O Visual Law tem se tornado cada vez mais popular e utilizado por profissionais como ferramenta de persuasão.
O Conselho Nacional de Justiça recentemente reconheceu a ferramenta como fundamental e recomenda o seu uso sempre que possível na Resolução nº 347/2020: “Sempre que possível, dever-se-á utilizar recursos de visual law que tornem a linguagem de todos os documentos, dados estatísticos em ambiente digital, análise de dados e dos fluxos de trabalho mais claros, usuais e acessíveis”.
Veja como usar o Visual Law para ganhar processos como advogado seguindo essa estrutura:
Análise de Casos
Na análise de casos, o Visual Law pode ser uma ferramenta valiosa para advogados. Ao representar a linha do tempo dos eventos do caso por meio de diagramas de fluxo, torna-se mais fácil identificar pontos cruciais e avaliar estratégias legais.
A criação de gráficos de relacionamento também permite destacar conexões entre as partes envolvidas, testemunhas e evidências, simplificando a compreensão do contexto do caso.
Preparação de Argumentos
Para a preparação de argumentos sólidos, o Visual Law desempenha um papel importante. Desenvolver apresentações visuais que enfatizem os principais pontos do argumento torna documentos, fatos e dados mais impactantes e memoráveis.
O uso de infográficos também é eficaz para resumir evidências de forma clara e convincente, tornando os dados mais fáceis de entender em menos tempo.
Apresentação em Tribunal
Em tribunal, o Visual Law pode ser uma estratégia persuasiva. A criação de apresentações de slides visualmente atraentes ajuda a apoiar a argumentação, tornando-a mais envolvente para juízes e júris. Além disso, a exibição de demonstrações visuais de evidências, como fotos, vídeos ou diagramas, pode reforçar os argumentos apresentados.
Resumos visuais concisos também auxiliam jurados e juízes a entender rapidamente os aspectos essenciais do caso.
Comunicação com Clientes
No relacionamento com os clientes, o Visual Law facilita a comunicação. O uso de gráficos ajuda a explicar processos e informações jurídicas de forma mais acessível, auxiliando na tomada de decisões informadas.
A apresentação visual das opções disponíveis e suas consequências torna mais fácil para os clientes entenderem os próximos passos. Dessa forma, fornecer linhas do tempo visuais ajuda os clientes a acompanhar prazos e próximos passos do processo, enquanto infográficos de comparação ajudam a visualizar alternativas.
Negociações e Resolução Alternativa de Litígios
Em negociações e resolução alternativa de litígios, o Visual Law pode ser valioso. A criação de gráficos que representam cenários potenciais e seus resultados esperados facilita a identificação de áreas de compromisso. Além disso, mapas que apresentem a progressão das negociações podem ajudar a identificar caminhos para a resolução de disputas.
Lembre-se de que a eficácia do Visual Law depende da qualidade das representações visuais e de sua capacidade de aprimorar a comunicação e a persuasão. Certifique-se de que todas cada informação apresentada esteja correta e seja relevante para o caso.
Por fim, adapte sua abordagem visual ao público-alvo, seja ele um juiz, um júri, um cliente ou outro advogado. O uso adequado do Visual Law pode melhorar significativamente as chances de sucesso em processos.
Desafios do Legal Design
Embora o Legal Design tenha um grande potencial para transformar o mundo jurídico, também enfrenta alguns desafios, como a resistência cultural, já que muitos profissionais ainda seguem formas mais tradicionais e complexas de comunicação e apresentação das informações.
Outro aspecto ainda desafiados é garantir que Visual Law e Legal Design possam beneficiar a todos, pois ainda existem barreiras como deficiências visuais. Por isso, é fundamental que a acessibilidade seja priorizada em todos os elementos visuais, contratos e plataformas digitais.
Conclusão
Visual Law e Legal Design está transformando o mundo jurídico, tornando-o mais acessível, eficiente e compreensível. À medida que a sociedade se torna cada vez mais apoiada na tecnologia na comunicação visual, a necessidade de uma abordagem orientada pelo design para o direito se torna mais evidente.
É importante que advogados, designers e educadores colaborem para aproveitar ao máximo o Legal Design e garantir que ele beneficie a todos. Afinal, o acesso à justiça é um direito fundamental que deve ser garantido para todos os membros da sociedade, e o Legal Design e o Visual Law são ferramentas valiosas nesse esforço para tornar o direito mais acessível e focado no ser humano.